Cantalamessa: Jesus deve nascer agora espiritualmente da Igreja e de cada fiel

“Quando se completou o tempo previsto, Deus enviou o seu Filho, nascido de uma mulher”. É sobre o significado e a importância destas últimas palavras – “nascido de uma mulher” – que queremos refletir nesta última meditação, também pela sua pertinência com a solenidade do Natal que estamos prestes a celebrar.

Com estas palavras, o pregador da Casa Pontifícia, o frade capuchinho cardeal Raniero Cantalamessa, introduziu, na manhã desta sexta-feira (17/12), na Sala Paulo VI, no Vaticano, sua terceira e última meditação deste tempo do Advento, intitulada “Nascido de uma mulher”, feita à Cúria Romana com a presença do Santo Padre.

Na Bíblia, a expressão “nascido de uma mulher” indica a pertença à condição humana feita de fraqueza e mortalidade. Basta tentar tirar estas palavras do texto para nos darmos conta de sua importância. O que seria o Cristo sem elas? – perguntou o religioso franciscano. Uma aparição celeste, desencarnada. Também o anjo Gabriel “foi enviado” por Deus, mas para depois retornar ao céu como tinha descido dele. A mulher, Maria, é aquela que “ancorou” para sempre o Filho de Deus na humanidade e na história.

O pregador da Casa Pontifícia observou que São Leão Magno colocará a expressão paulina “nascido de uma mulher” no coração do dogma cristológico, escrevendo no Tomo a Flaviano que Cristo é “homem pelo fato de que ‘nasceu de mulher e nasceu sob a lei’... O nascimento na carne é clara prova da sua natureza humana”.

“Mulher” é o termo com o qual Jesus se dirige a sua mãe em Caná e sob a cruz. É difícil, para não dizer impossível, não ver um elo, no pensamento de João, entre as duas mulheres:  a mulher simbólica que é a Igreja e a mulher real que é Maria. Tal elo é colocado na Lumen gentium do Vaticano II que, justamente por isso, trata de Maria dentro da constituição sobre a Igreja, continuou o cardeal Cantalamessa.

Cristo deve nascer da Igreja

A este ponto de sua reflexão, o pregador ressaltou que “Jesus, que nasceu uma vez física e corporalmente de Maria, deve nascer agora espiritualmente da Igreja e de cada fiel”. O cardeal Cantalamessa observou que se no “sentido mais pleno” (o chamado sensus plenior), a mulher na Escritura indica a Igreja, então a afirmação de que Jesus nasceu de uma mulher implica que ele deve nascer hoje da Igreja!

Continuando esta sua terceira meditação do tempo do Advento, Cantalamessa destacou a existência de um ícone muito difundido entre os cristãos ortodoxos, que é chamado de Panhagia, isto é, a Toda Santa. Nele, vemos Maria de pé, em estatura completa.

Em seu peito, como que irrompendo de dentro, sobressai o menino Jesus, que tem a majestade de um adulto. O olhar do devoto é atraído pelo menino, antes mesmo que pela mãe. Ela, por sua vez, está com os braços erguidos, quase convidando a olhar para ele e dar-lhe espaço.

“Assim deveria ser a Igreja” – disse o pregador: “Quem a olha não deveria se deter nela, mas ver Jesus. É a luta contra a autorreferencialidade da Igreja, sobre a qual frequentemente têm insistido os dois últimos Sumos Pontífices, Bento XVI e o Papa Francisco”.

Cristo deve nascer da alma

Na última parte de sua meditação, o pregador da Casa Pontifícia refletiu sobre o que nos diz respeito mais de perto: o nascimento de Cristo por parte da alma fiel. “Cristo – escreve São Máximo Confessor – nasce sempre, como quer, misteriosamente, encarnando-se através daqueles a quem salva: ele faz da alma grávida uma mãe virgem.”

Como tornar-se mãe de Cristo, explica-nos Jesus no Evangelho: escutando, diz ele, a Palavra e pondo-a em prática (cf. Lc 8,21). É importante notar que há duas operações para se fazer. Também Maria se tornou mãe de Cristo através de dois momentos: primeiro, concebendo-o, depois, dando-o à luz.

A propósito de como podemos também nós o conceber e dar à luz, o frade capuchinho trouxe uma palavra de São Francisco de Assis, que – ressaltou ele - bem resume o que queria evidenciar:

“Somos mães de Cristo – afirma – quando o levamos em nosso coração e em nosso corpo, pelo amor divino e a consciência pura e sincera; e o damos à luz pela santa operação, que deve iluminar os outros com o exemplo.”

Nós, ele quer dizer – explicou Cantalamessa -, concebemos Cristo quando o amamos em sinceridade de coração e com retidão de consciência, e o damos à luz quando fazemos obras santas que o manifestam ao mundo e dão glória ao Pai que está nos céus (cf. Mt 5,16).

Trazer de volta a essência do Natal

O pregador da Casa Pontifícia concluiu voltando seu pensamento a Maria, fazendo-nos uma premente exortação a trazer de volta a essência do Natal:

“Vamos imitá-la reservando para nós alguns momentos de verdadeiro recolhimento para fazer nascer Jesus em nossos corações. A melhor resposta à tentativa da cultura secularizada de eliminar o Natal da sociedade é internalizá-lo e trazê-lo de volta à sua essência.”

 
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